sexta-feira, 20 de novembro de 2009

São Paulo

A escada está muito suja e eu não importo com isso. Posso afirmar que vejo tudo amarelado, quase sépia.Subo degrau por degrau colocando meus dois pés em cada um antes de subir para o próximo.Ambiente sépia, pensamento também. Antes nunca tivesse atravessado a porta da sua casa pela primeira vez, assim agora eu teria a minha casa, assim agora eu não subiria lentamente essas escadas.
Sempre achei terraços de prédios encantadores e nunca tinha estado em um. Assistia na tv, no cinema. Sempre tem uma cena romântica que se faz mais linda meio ao cinza dos prédios, e quanto mais janelas ao redor melhor, mais chances de alguém testemunhar algo tão lindo.Há 5 anos atrás essa escada estava limpa e o prédio tinha sido abandonado a pouco tempo. Enquanto subo lembro do sapato que você usava no dia que subiu comigo pela primeira vez, no dia que sem eu nunca ter dito nada sobre terraços você me trouxe no alto da cidade mais cinzamente linda que eu conheço, São Paulo.
São Paulo me trouxe mais do que imaginei quando resolvi viajar apenas para passar as férias. Depois de tanto estudar nos últimos períodos da faculdade, depois de tantas brigas com minha mãe, depois de perder aquele que muito enganda achei que era o amor da minha vida, fiz as malas e pronto : São Paulo. Muitos prédios, muito cimento, muita gente, muitas janelas, tudo que eu queria. Sozinha cheguei e sozinha pretendia ficar. Até ser invadida por algo que posso sentir até hoje.
-Me empresta seu isqueiro?
-Eu não fumo.
-Deveria.
-Você não deveria.

Desde então fomos só nós dois.
Bem brega nosso começo. Mas prefiria um fim brega, um fim em que você deixasse de me amar. Não que você fosse embora assim. Morrer não é brega.
*
Finalmente chego no fim da escada. Respiro fundo antes de abrir a porta de ferro, você sempre abria para mim. Vou sentar e esperar a dor passar, amanhã volto pro Rio. Aqui tudo me lembra você, aqui tudo é como esse terraço. Melhor deixar aqui muitas lágrimas, muita saudade e um pedaço de mim.
Lá embaixo a sépia vai voltando a ser cinza, sento bem na pontinha e nada de ruim passa na minha cabeça, é só a saudade que parece abrir o chão. O cinza não me parece mais bonito, parece só cinza. Vou buscar nas cores da minha cidade alguma tranquilidade, vou desejar nunca ter vindo para cá. Assim como desejei nunca ter ido na sua casa na noite do isqueiro. Esses desejos duram o tempo de me arrenpender por ter desejado. Nenhuma dor é capaz de fazer com que eu não queira ter vivido todos os segundos que vivi ao seu lado.
*
Construímos juntos muito mais do que já está embrulhado para mudança, construímos tudo que eu sou agora, com erros e acertos eu aprendi o que é gostar de alguém. Vou prender nossa foto na porta de ferro e descer as escadas.

2 comentários:

  1. Se me permite expressar o que senti, não quero falar do que escreveu. Quero só registrar aqui que gostei do seu jeito quando te conheci. Adorei suas fotos quando vi (adoro todas!). E agora admiro a força que já via antes, mas agora tá aqui, em forma de escrita. Parabéns por ser você! Beijoca!

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  2. Paulinha, querida! Muito querida. A gente realmente não sabe metade do que as pessoas passam. Ah, como eu queria te dar um abraço. Como dói ver alguém que amamos muito ir embora sem nem ter a chance de voltarmos a vê-lo, se tivermos uma recaída. Separações são terríveis, forçadas e eternas então, nem se fala. E dói pra sempre. A gente esquece um pouco, às vezes muito, mas sempre volta. Dói aqui também. demais.

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