domingo, 3 de abril de 2011

A carona

No banco do carona eu espero e sinto muito calor. Não sei por mais quanto tempo vou ocupar aquele lugar, você dirige e não me importo. Finjo que não vejo você chegar, não movimento nenhum músculo do corpo, nem mesmo por sentir o suor queimando meus olhos. Você senta, liga. O carinho que nos é anterior a qualquer coisa, logo se faz presente em nossos braços que se cruzam, coxa e nuca. Tenho a certeza de que irei buscar esse cruzamento em próximos encontros de minha vida, no entanto quando outros dedos encontrarem minha coxa não sei serei capaz de levantar a mão e tocar outra nuca . Nossos entrelaces, por mais fortes que ainda sejam não tem mais lugar em nossas vidas.
O carro está andando, minha mão perde a força e não te segura mais. Meus olhos perdem o foco, me sinto submersa. Logo acima de nós uma ponte, um elevado, alguma coisa assim, parece que todos os carros resolveram ir por lá e deixaram esse casal falido na parte de baixo.
- Meu amor, minha casa é para o outro lado.
- Sua casa? Casa dos seus pais.
- Agora eu vivo lá.
- Não deveria.
Você ensaia uma briga e eu não quero escutar. Sua mão direita já voltou para a direção desde que chegamos perto da ponte. Não sei se por raiva, por nojo. Talvez não sinta mais que sou sua. Eu sou, sempre vou ser, só não aguento mais as dores que sinto após nossas brigas. Enquanto brigamos me sinto viva, sinto que te amo e que você me ama de volta. Parece que exatamente por isso, por não suportarmos sentir intensamente o indefinível, gritamos, quase nos agredimos. O que dói é a morte que sinto depois, me falta um ar que não sai dos pulmões, poderia morrer e ter um corpo vivo. Será que você me entende?
Saio do seu carro, meu chaveiro com outras chaves. Te abraço, você fica imóvel. Aceito aquilo como amor e vou embora. Lembro-me da primeira vez que precisamos nos separar e você disse : "não olhe pra trás". Não obedeci, claro! Assim que o vidro tornou-se transparente somente para mim, fixei meus olhos no cenário que você ocupava, virei para trás e mantive meu pescoço travado até que a curva do ônibus me roubasse de você por 6 meses. Lembro e decido que agora não poderá mais durar seis meses, tem que durar para sempre. Não olho para trás, dessa vez o vidro é transparente para você.


" Sometimes it lasts in love, but sometimes it hurts instead "

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